
Domingo (6/4) de manhã, 20 mil fiéis reunidos na Praça de São Pedro, na Cidade do Vaticano, para o Jubileu dos Enfermos e do Mundo da Saúde. Não haveria ocasião mais propícia para uma surpresa. A apenas duas semanas da Páscoa, o papa Francisco, 88 anos, fez uma breve aparição — a primeira desde que recebeu alta do hospital Gemelli, em 23 de março — e saudou os peregrinos, entre eles, pacientes, médicos, enfermeiros, farmacêuticos, fisioterapeutas, profissionais da saúde e voluntários que viajaram de 90 países para a celebração.
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Depois de ser internado por 37 dias, acometido por uma pneumonia dupla, e ficar à beira da morte, o pontífice argentino surgiu na praça depois de missa celebrada pelo arcebispo Rino Fisichella, pró-prefeito do Dicastério para a Evangelização, que leu a homilia escrita por Francisco. "Irmãos e irmãs, a poucos metros de nós, o papa Francisco, de seu quarto na Casa Santa Marta, está perto de nós e participa, como tantos doentes, tantas pessoas frágeis, desta Santa Eucaristia pela televisão. Sinto-me feliz e honrado por oferecer minha voz para ler a homilia que ele preparou", disse Fisichella.
O pontífice chegou à Praça de São Pedro em uma cadeira de rodas e com cânulas de oxigênio presas ao nariz. Pouco antes de se unir aos fiéis, Francisco recebeu o sacramento da reconciliação, na Basílica de São Pedro, orou por alguns minutos e atravessou a Porta Santa, de acordo com a imprensa do Vaticano. Enquanto o líder de 1,4 bilhão de católicos era levado entre os fiéis até o altar, os peregrinos gritavam: "Longa vida ao papa!". Francisco rapidamente se dirigiu aos fiéis: "Bom domingo a todos! Muito obrigado!". Diante de milhares de câmeras e celulares, abençoou os peregrinos e fez questao de cumprimentar, um a um, algumas pessoas atrás do altar instalado no local.
Na homilia redigida pelo papa e lida por Fisichella, ele diz que "não há dúvida de que a doença é uma das provas mais difíceis e duras da vida, durante a qual tocamos com a mão o quanto somos frágeis". O jesuíta argentino também se dirigiu aos "queridos irmãos e irmãs doentes". "Neste momento da minha vida, estou a partilhar muito: a experiência da enfermidade, de me sentir frágil, de depender dos outros em tantas coisas, de precisar de apoio", escreveu. "Nem sempre é fácil, mas é uma escola, na qual aprendemos todos os dias a amar e a deixarmo-nos amar, sem exigir nem recusar, sem lamentar nem desesperar, agradecidos a Deus e aos irmãos pelo bem que recebemos, abertos e confiantes no que ainda está para vir." De acordo com Francisco, na doença, se pode renovar e fortalecer a fé.
Atenção e cuidado
Em entrevista ao Correio, Fabio Marchese Ragona, coautor da autobiografia do papa Francisco, intitulada Vida, disse acreditar que Francisco escolheu precisamente a missa dedicada aos doentes para, na condição de uma pessoa enferma, estar presente. "Ele quis mostrar para o mundo sua fraqueza e sua fragilidade. Antes da missa, o pontífice realizou a peregrinação jubilar dos doentes, com a confissão e a travessia da Santa Porta da Basílica de São Pedro, como se fosse um peregrino", afirmou. "Doente entre os doentes, o papa quis, neste momento, levar a carícia de Deus a todos aqueles que precisam de cuidados. Ao mesmo tempo, com sua presença, ele pretendia enviar uma forte mensagem sobre o fato de que deve haver atenção e cuidado para aqueles que necessitam de atenção e de amor."
Autor de dois livros-entrevistas com Francisco, Domenico Agasso — vaticanista do jornal italiano Il Stampa — admitiu ao Correio que a aparição do papa foi um sinal claro de sua determinação e proximidade para com os fiéis. "Mesmo durante a sua convalescença, ele quis estar presente: a sua presença fala mais alto que as palavras. Aos peregrinos e aos fiéis quis dizer: 'Estou convosco'", explicou. Para Agasso, trata-se de uma mensagem de resiliência, de esperança concreta. "O papa, no seu momento de fraqueza, aproxima-se ainda mais, e continua olhando para frente, com confiança", acrescentou Agasso.
O jornalista do Il Stampa concorda com Ragona sobre a capacidade de comando de Francisco. "O papa continua a guiar a Igreja com clareza e tenacidade. Francisco informou que assinou e entregou a renúncia ao pontificado, em caso de impedimentos graves e permanentes. Ao mesmo tempo, disse que considerava o ministério do papa 'ad vitam' ('para a vida', em latim)", comentou Agasso.
DUAS PERGUNTAS PARA...
FABIO MARCHESE RAGONA, coautor da autobiografia do papa Francisco intitulada Vida
Que mensagem o papa Francisco quis enviar para os fiéis com a aparição surpresa?
Acho que foi um gesto muito bonito do papa Francisco, porque ele compreendeu que as pessoas precisam de sua presença física. Apesar do sofrimento causado pela doença e dos muitos riscos de um retorno da pneumonia, ele quis estar presente na praça. É uma importante mensagem porque o papa continua na linha do "pastor" que deve sentir o cheiro das ovelhas. Ele não queria deixar seu rebanho sozinho e, por isso, fez essa surpresa para todos.
O senhor acredita que exista uma pressão crescente, dentro da Igreja, para que ele renuncie?
Penso que a pressão pela renúncia é inútil, porque Francisco decide de forma autônoma e também porque, como diz o código de direito canônico, a renúncia do papa deve ser livre e não imposta, para ser válida. Neste momento, o papa não tem absolutamente intenção alguma de renunciar. Ele disse que o pontificado é para a vida e que a Igreja se governa com a cabeça, não com as pernas. Francisco está muito lúcido e, mesmo do hospital, continuou a governar a Igreja. Levará tempo para sua recuperação, mas acho que ele continuará no caminho que iniciou 12 anos atrás. (RC)
EU ACHO...
"Mais uma vez, o papa se colocou ao lado daqueles que sofrem. É um gesto altamente simbólico: ele mesmo, marcado pela doença, reza por aqueles que estão na mesma condição. Há uma profunda identificação com o frágil, que se torna testemunho. Os peregrinos percebem isso e, ao ver o pontífice chegar, inesperadamente, à Praça de São Pedro. Mesmo que sua voz ainda esteja fraca, eles respiram aliviados: o pontífice está ali, ele luta, sorri, transmite determinação, olha para frente. Essa cena fortalece a fé e o carinho do povo por ele."
Domenico Agasso, vaticanista do jornal italiano Il Stampa e autor de dois livros-entrevistas com o papa Francisco
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